A Polícia Ambiental e a Fundação Floresta demoliram nesta quinta-feira (4) três casas de caiçaras na Estação Ecológica Juréia-Itatins, na comunidade de Rio Verde-Grajaú, sob argumento de que ocupavam uma área ilegal.
Segundo o advogado André Luiz, que acompanhou, a demolição aconteceu após um parecer do procurador-geral do Estado, sem uma decisão judicial que amparasse a medida, que, ainda segundo o advogado, viola a convenção 179 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e o decreto 6040/2007.
O Coletivo Ativista Litoral Sustentável, entidade ambientalista da cidade de Peruíbe e que atua no litoral de São Paulo, lançou nas redes sociais um manifesto. Abaixo reproduzimos o Manifesto do CALS
MANIFESTO CAIÇARA: A JURÉIA É NOSSA
Criada em meados dos anos 80 no governo Franco Montoro, a Estação Ecológica Juréia Itatins surgiu sem que houvesse um amplo debate entre todos os setores da sociedade envolvidos.
Desde o início, o modelo adotado não contemplou a presença humana, seus espações territoriais e seu meio cultural: para as pessoas que ali viviam há décadas, fora imposta a mão pesada do Estado.
Os assim chamados “caiçaras” foram afastados das discussões e tratados como um “empecilho” para a conservação da Juréia.
Tal modelo preservacionista e restritivo pressupõe que, para garantir a integração biológica e as interações ecossistêmicas, faz-se necessário a criação de espaços “intocados” – o que impede a reprodução social e cultural dessas comunidades.
Esse conflito se estende até hoje: o dilema entre preservação e o direito dos povos tradicionais.
O fato é que por séculos essas comunidades tradicionais desenvolveram técnicas e modelos de produção peculiares, através de um profundo conhecimento empírico do mundo natural onde vivem.
Atualmente, diversos estudos científicos corroboram no sentido de que a permanência dessas comunidades no ambiente natural auxiliam na preservação do meio ambiente local.
A triste história brasileira se repete em diversos tempos e nas mais variadas regiões. Aos poucos, impossibilitados de exercer a pesca, a caça e a lavoura, enfim, de subsistir, as famílias que viviam na Juréia foram forçadas a deixar seu lar e migrar para as cidades, ao passo que o Estado, através da política de privatização, agora busca entregar à iniciativa privada a responsabilidade de resguardar o meio ambiente e explorar seus recursos.
Aqueles que perseveraram, até hoje convivem com ameaças e restrições. A mais recente, a derrubada de residências de famílias tradicionais.
Alguns acreditam que há certa discussão acerca da legalidade das construções. Contudo, a tolerância e displicência na fiscalização de condomínios, hotéis, marinas, resorts, etc, erguidos em áreas irregulares e de preservação nas praias de nosso litoral contrasta drasticamente com a violência como são tradados os caiçaras.
Mais uma vez ignorados, esses povos não usufruem o direto ancestral ao seu território e àqueles que um dia deixaram suas casas em busca de uma vida melhor, e que não podem sequer sonhar em voltar ao seu lar.
A história da terra no Brasil é marcada por violência e exclusão dos povos tradicionais em detrimento de privilégios para setores da sociedade que se perpetuam como proprietários desde as capitanias hereditárias.
O Estado pune com rigor e autoritarismo os povos tradicionais, ao passo que é conivente com os poderosos.
Nesse sentido, o CALS se solidariza com a luta dos povos tradicionais e presta total apoio a resistência caiçara!
Peruíbe, 05 de julho de 2019.